Título Original: The Tragedy Paper
Título nacional: Da ordem ao caos
Autora: Elizabeth Laban
Editora: Farol Literário
Páginas: 317
Onde Comprar: Livraria Travessa
Saraiva
Da ordem ao caos é o primeiro romance da escritora Elizabeth Laban. Nele ela retoma algumas de suas experiências da época de seu terceiro ano de ensino médio, mais precisamente a árdua tarefa de escrever um ensaio sobre a tragédia, um gênero literário ainda muito debatido entre os profissionais de Letras e Teatrólogos.
O enredo do romance se passa, em sua maioria, no internato chamado colégio Irving local muito bem descrito desde a separação das alas feminina e masculina, até detalhes como o uniforme, as regras rígidas, a alimentação e como o cardápio variava e era criado de acordo com as colheitas em diferentes regiões e os privilégios e responsabilidades que apenas os terceiranistas tinham. Dentre as tarefas uma em especial perturba Duncan, um personagem central, o ensaio sobre a tragédia algo que se compara a uma monografia. Já uma concessão que deveria ser motivo de alegria também aflige o garoto: com que quarto ele ficaria e qual seria o seu "tesouro"?

Quero que você, leitor entenda que era uma tradição do colégio Irving que os novos terceiranistas tivessem um quarto só para si e que o último usuário do espaço deixasse um "tesouro" para o aluno do ano seguinte. Tesouro com aspas, pois esses presentes variavam muito como, por exemplo, um animal de estimação, um pedaço de pizza ou uma garrafa de bebida alcoólica. Porém Duncan tinha um mal pressentimento e ele se concretiza quando ele se dá conta de que ficou com o pior quarto, justamente o que fora ocupado por alguém que mudou tragicamente a história do colégio, o albino, Tim Macbeth (um sobrenome um tanto irônico).
E, como se não bastasse a tamanha decepção, seu "tesouro" não era nada empolgante: uma pilha de CDs. Mas quem em pleno século XXI, ouviria CDs? Contudo o bilhete que Tim deixa junto aquele presente que mais se assemelhava a uma piada desperta curiosidade em Duncan por diversos motivos. Primeiro, Tim conta como aquele quarto, apesar de minúsculo, tem lá seus encantos; segundo, ele promete explicar algo que aconteceu no ano anterior e de alguma forma afetou Duncan, mistério esse que nos faz devorar o livro e terceiro, Tim dará a ele a matéria do ensaio sobre a tragédia.
Com tantas possíveis vantagens, Duncan não pensa duas vezes antes de apertar o play e reproduzir os CDs gravados por Tim e cada vez que ele avança não consegue mais parar de ouvir o garoto narrar sua versão da história.
O livro é intercalado por capítulos que contam a apreensão de Duncan quanto ao seu último ano no colégio Irving que se mesclam com seus conflitos internos. E outros capítulos, esses em maior quantidade, em que Tim, apesar de não estar presente conta por meio das gravações como foi da glória a catástrofe. Da ordem ao caos em seu primeiro e último ano no internato.
"Como foi a viagem?
Complicada, eu queria dizer, e acho que me apaixonei no caminho." P.199
Tim, como eu escrevi no início, era albino e nunca foi bem aceito por isso, nem por ele mesmo. Filho único e um garoto de poucos amigos, se sente deslocado por sua completa falta de pigmentação. Durante sua narração sobre a ida para o novo colégio ele deixa escapar pensamentos sobre si mesmo o que contribui para o leitor fazer uma análise da psique do personagem. Enfim, nessa viagem ele conhece Vanessa, garota por quem ele se apaixona e coincidentemente estudará com ele. Ao lado de Vanessa, Tim passa por momentos de intensa felicidade no qual ele descreve que foi como se as leis normais não se aplicassem, ou seja, ele não se sente rejeitado e constrangido dentre outras coisas que podemos inferir. Mas é justamente essa sua paixão e obsessão por Vanessa que o leva a tomar decisões erradas e ir a ruína.
"Bem que podia haver um grande sinal luminoso, vermelho e piscante que se acendesse toda vez que alguém tomasse uma decisão ruim ou, naquele caso, uma decisão catastrófica. Um alerta ou algo que avisasse para a gente voltar atrás e tentar de novo." P. 169
O interessante é que antes de ter contato com as gravações, Duncan se sentia responsável pelo acontecimento fatal do ano passado. Sendo assim, a história de Tim é bem mais que uma analise de uma tragédia para uma matéria escolar, mas uma oportunidade para Duncan se perdoar e aprender com os erros dos outros.
A obra contém personagens instigantes como a própria Vanessa. No entanto, é preciso ter em mente que a descrição da personagem como uma garota ora doce, ora enigmática vem de Tim alguém que a idealizava, portanto, é uma visão subjetiva dos fatos. Outro ponto interessante e que guarda relação com os personagens é a proveitosa aula de literatura que temos com o professor Simon. Sem dúvida ele é um personagem que leva a ficção a sério e por vezes eu fiquei me perguntando se ele próprio não era um tanto obsessivo e algumas de suas atitudes soavam engraçadas. Mas é inegável que ele tenha ampliado o meu entendimento sobre a tragédia e o meu vocabulário sobre o assunto.
"Às vezes é difícil, ou até mesmo impossível, saber antes do fim se uma escolha tem ou não caráter elevado." P. 249
O enredo em minha opinião foi bem criativo, porém eu gostaria de ter conhecido um pouco mais sobre o Duncan. Muito da história fica por conta das observações de Tim e não posso esconder que foi difícil imaginar o garoto narrando a história e se lembrando detalhadamente de todos os diálogos. Como ponto positivo destaco a linguagem utilizada pela autora que se adequa a fala coloquial dos jovens. E por último, não tem como não se interessar em estudar o gênero literário abordado e visualizar Tim como um herói que depois de falhar tenta se punir e aceitar a sua sina.
A lição que ficou pra mim foi a de que não é preciso errar para aprender. Podemos muito bem aprender com os erros dos outros.